A voz de Lula
TALES AB’SABER
Dizem que a voz do povo é a voz de Deus. A voz é mesmo o lugar privilegiado em que o corpo humano, ele próprio, mimetiza a natureza em um ato de prestidigitação primeiro, no canto, o canto do vento, o canto dos pássaros, o canto e seu compromisso profundo de tentar dar nome ao amor. Nesse lugar, acontecimento, arte, divindade e simples humanidade se encontram. E, na verdade, a voz não é um lugar, mas a performance fundamental de uma potência. É o acontecimento por excelência, como o corpo, base de todos os demais acontecimentos.
Todavia, sabemos que a política não é movida exatamente pelos valores estéticos da voz. E, ainda nesse aspecto,o caso do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, ou Lula – com o nome e sua poesia carregada de cordialidade popular, estratégia profunda de poder, que ele e todos preferimos –, é bastante exemplar.
Diferentemente do campo isolado da arte musical, em que voz e personalidade do artista se confundem de forma íntima, configurando a eficácia fundamental da própria expressão, a política é movida por pensamento, ilusão, linguagem retórica desenvolvida, realizações econômicas e sociais, positivas ou não, mentiras eficazes, pactos, compromissos e lutas. No fim das contas, a voz, diante de tantas dimensões e do equilíbrio complexo de tantos mundos humanos animados na política, parece ser reduzida à sua faceta mais neutra, e pobre, de mero meio. Não faz sentido na política um pacto de corpo e voz como o que leva a se admirar um João Gilberto, um Dorival Caymmi, uma Elis Regina, ou mesmo, no nosso caso especialmente, um Nelson Cavaquinho… Não deveria haver na política, e de fato não há, um homem que fosse conhecido como The Voice, como foi o maior cantor americano do século 20.
Édipo não cantou ao solucionar o enigma e precipitar a Esfinge no abismo, tornando-se rei. A política não é estética desse modo, a princípio, e apesar de Dioniso ela não é órfica. Sua ação comunicativa total, que desenha os fundamentos do real, não submete o homem político à importância particular de sua voz. Ele não encanta por ela, não manipula por ela, embora seja por meio dela, como fundo oculto em contato com o além do humano, a evocação do poder da voz diante das coisas, que de fato tudo fale nele.
Interessantemente, as figurações muito tradicionais em que o poder estético da voz encontrou a política, em que a música encontrou o poder, costumam despersonalizar e esvaziar o humano da voz, e tratá-la como uma espécie de voz pura e mágica, como a voz de Deus. Se o poder de sedução estético do poeta e do artista, com sua voz influente, se fundisse ao poder de sedução retórico do político, ao jogo de entendimento e dissimulação humano, os mitos costumam dizer, então teríamos uma figura titânica e onipotente, para todo o bem e para todo o mal possíveis. Alguma coisa como o tirânico da voz pura do grito do bebê.
O flautista de Hamelin fez um trato com o poder e esperava ser pago, como uma espécie de mercenário, ou de técnico moderno, para encantar com sua flauta os ratos da cidade, afastá-los de lá e, assim, purificá-la do mal. O rei se recusou a pagar-lhe o ouro combinado, já que sua mágica estética eficaz parecia ter sido tão fácil de realizar… O flautista então leva as crianças da cidade com o mesmo poder encantatório de sua flauta… A voz pura e eficaz do poder da flauta, mágica e vingadora, simplesmente totalitária. Também Deus derrubou as muralhas da cidade inimiga, Jericó, com a voz vazia de significação e que era pura intensidade, para além de todo humano, da energia das trombetas de Israel. A voz de Deus, quando orientada para a política, é pura, mimética, mas não humana, é estética vazia, e carrega em si simplesmente todo o poder social da transformação. Foi esse tipo de voz que Ulisses, calado, mas erigido sobre uma prática material astuta, calou, mas ouviu, das sereias maravilhosas e devoradoras.
Foi o ator e o teatro que tentaram fundir os valores da voz e os da política, da tragédia grega a Shakespeare, a Brecht, ao laconismo e mutismo próprio do terror do século 20 de Beckett. E sabe-se que em alguma medida todo político é um ator, mas também que quanto mais o político for percebido como ator, certamente pior político ele será… E talvez por isso mesmo sua voz deva ser simplesmente prosaica, voz do mundo da vida, voz comum, voz não representada, o oposto da voz do ator…
Mas o político tem também o momento de grandeza estética maior de sua voz, quando ela, vinda do alto e do céu, deveria cobrir o mundo, se projetar até o horizonte de toda a pólis, encobrir a todos como um imenso guarda-chuva do sentido, uma capa do entendimento, resgatando todos para a possibilidade sedutora e racional de um pensamento comum e a tão almejada busca de consenso, ou mobilização das paixões. O discurso público dos grandes homens, arte retórica e expressão de si na vida comum humana, modelar para os antigos romanos, forma de dominação e sedução para o pensamento, só se viabiliza pela projeção e pela pulsação de um pensamento que sabe bem se fazer voz. E aí, no horizonte do encontro daquela voz e daquele povo de algum modo tornado comum nela, a voz do povo, leia-se do político, é a voz de Deus, leia-se, do político… A voz… E Lula teve imensos momentos históricos dessa natureza, talvez os maiores, e em maior número, que um político brasileiro jamais teve.
Temos políticos de voz péssima e até mesmo patética, e no entanto extremamente eficazes em suas ações e convocações para o poder, como foi Jânio Quadros, por exemplo. A voz de Kennedy era infantil, algo feminina, quase fraca, em oposição à beleza forte daquele rosto, que também tinha um traço feminino, de modo que aquela voz parecia incapaz de sustentar as pressões no poder que o homem com rosto de cinema simplesmente sustentava. A fragilidade daquela voz, de esquerda americana mal recebida no coração da Guerra Fria, teria algo a ver com a fantasia de que aquele homem tão poderoso, o primeiro historicamente a operar o novo tipo de carisma pop, podia de fato ser exterminado? Hitler impressionou pela força apaixonada de seus discursos carregados de arcaísmos, além dos histrionismos apatetados, ainda mais estranhos e impressionantes pela total falta de caráter daquela voz comum, verdadeiramente banal. Ali, naquela equação de corpo, baixa humanidade e voz, já se configurava o famoso princípio da banalidade do mal. Fernando Henrique Cardoso operava o governo e as relações políticas como quem estivesse sempre conversando com seu interlocutor, em uma posição ligeiramente superior, pela suposta sabedoria acadêmica paulistana em jogo, mas sedutor, quase melífluo, no sutil reconhecimento do lugar do outro na conversa, a quem parecia sempre tentar convencer, mas a quem também sempre ofertava – guardando algo de servil? – a possibilidade sempre considerada de o outro vir a se tornar de fato um poder, e então…
É curioso imaginarmos que um dia no futuro as pessoas não saberão mais dar o intenso valor íntimo – mesmo com toda a documentação cada vez mais imediatamente presente — que a voz de Lula tem para aqueles que conviveram com ele e participaram de seu tempo histórico. Como a voz de Getulio Vargas não diz praticamente nada… E é estranha a possibilidade brusca, iminente, suspensa, da perda dessa voz que se tornou tão familiar quanto o literalmente familiar para nós, essa voz que nos constituiu muito mais do que somos capazes de dar conta no plano da mera consciência. Perdê-la, de qualquer modo, seria a morte de um tempo antes de seu próprio fim, movimento verdadeiramente estranho da história, que conhecemos bem a partir dos anos que nunca terminaram de 1964 e 1968…
Lula tem a voz de trovão do popular que rompeu o pacto conservador do homem cordial brasileiro. Para um inimigo político, que disputava a convocação carismática das massas com ele a partir dos anos 1980, ele era o Sapo Barbudo, em uma excelente e muito interessada caricatura política que resumia o personagem em três traços: a barba, a regressão anticivilizada e a voz. Porém, Lula é mesmo o popular moderno e finalmente liberto que rompeu o gesto de ser calado pelo intelectual e pela autoridade, representados por Paulo Martins na famosa cena — que guarda todo o segredo autoritário brasileiro – do “imaginem o povo no poder” de Terra em transe, de Glauber Rocha. Para quebrar aquele cala-boca real do jogo da conciliação cordial brasileira, tantas vezes cantado por Chico Buarque, com sua tradicional concentração de poder, e seu rebaixamento do popular a espectador e a matéria neutra da história, que não deveria ter voz nem mesmo para as próprias dores, era necessário um corpo muito forte, de torneiro mecânico, e uma voz muito especial, também ela forte, consciente da própria potência, que explodisse tais laços consentidos de submissão que se perdiam nas noites dos tempos mais profundos da má conciliação brasileira.
De fato, o gutural e áspero, ao mesmo tempo que belamente grave, de seu timbre, de sua inteligência pela voz, evoca algo das grandes figuras populares com suas vozes marcadas pela natureza, atravessadas pelas coisas mesmas que resistem ao humano, as coisas como matéria concreta, como vozes que carregaram pedras, que cortaram cana, que lavaram roupa, que viram a violência muito de perto, e no entanto cantaram, vozes que expressaram o espírito que resiste ao material embrenhado nele próprio, e que, por isso mesmo, eram, em si, especialmente sublimes, o próprio movimento do sublime, do encontro do baixo e concreto com o altíssimo: a voz de Clementina de Jesus, a voz de Nelson Cavaquinho.
A voz de Lula não é a voz do anjo popular lírico e de classe média, como a de Milton Nascimento ou a de Caetano Veloso, nem a voz elegantíssima do nobre popular, como a de Dorival Caymmi – embora o seu grave tenha muito remotamente algo a ver com ele –; ela é a voz do Preto Velho e de Exu, a voz do Sapo Barbudo, dos que expressam a conciliação com a violência recebida e encarnada, reconhecida e superada na voz-coisa de um violino de madeira velha, cujo arco toca seu corpo de pau sem cordas, ou melhor, que finalmente adquire cordas, e então canta e surpreende. Além disso, há pedras, ou máquinas poderosas, no fundo daquela voz.
Muito tem sido dito sobre a materialidade da tristeza e sobre a forma da poética de Nelson Cavaquinho e seus parceiros. Mas, interessantemente, pouco se dedicou ao fenômeno estético e humano radical e maravilhoso de sua voz. Voz de madeira e de moenda, sua conexão com o quebradiço das folhas secas é verdadeiramente interior, e se os pés pisam as folhas olhando para a própria morte, aquela cabeça de caboclo e sua voz arrancada da natureza da tristeza evoca a vida desentranhada da experiência material brasileira mais profunda, com a presença constante do risco da morte, da dor e do luto na vida do pobre que canta, em sua voz tão concreta e tão encantada. A coisa material da voz de Nelson Cavaquinho não se distingue do poder de suas imagens e de suas melodias, e o pé, a cabeça branca e também a voz pisam a mesma terra, experiência áspera do mundo tornada sublime. Essa é a voz popular que vibra, no interior do segredo de seu timbre atritoso, a experiência da vida encantada pelo horror e pela alegria, da pobreza brasileira. E mais alguma cachaça e algum cigarro. E Lula claramente tem algo dessa voz, no seu trovão gutural – e, como todos sabem desde crianças, a voz de trovão é sempre a voz de Deus – de político.
Durante muitos anos, Lula imprimiu uma verdadeira e impressionante energia em seus discursos, em comícios e encontros políticos, uma energia social que parecia, por mais que aquela voz tivesse de fato corpo para aguentá-la, imensamente maior que ela. Aquela voz queria simplesmente capturar, em seus limites, a força histórica sempre barrada do desejo de transformação de um país que se formou e que soube se modernizar conservador. Por aquela garganta passaram as forças de milhões de homens, dos companheiros e das companheiras, e o desejo coletivo de todo um povo de produzir uma diferença histórica, em uma história que aprendeu a progredir sem transformação. Aquela voz portava a energia social coletiva que era imensamente maior que cada um de nós que a sustentava e a sonhava em um comício na praça da Sé. Era sem dúvida necessária muita energia para alcançar a diferença, em uma história que tentava sempre simular modernidade sem diferir muito de suas raízes conservadoras pré-modernas, anti-cidadãs. Devemos lembrar que Lula simplesmente enfrentou com sua voz energizada de desejo histórico a grande ditadura de 1964, que até então costumava simplesmente exterminar seus inimigos. E que desde o início aquela voz única já tinha o tamanho de estádios, e estava sempre em expansão.
Toda essa grande energia foi condensada na fabulosa máquina de trabalho coletivo de um partido. Mas era expressa no corpo, na inteligência retórica concreta e popular e na incomensurável energia que atravessava as cordas vocais daquele único homem. Certamente não seria com a cançãozinha “Lula lá, nasce uma estrela…” — que já era a tentativa histórica de conciliação e adaptação da figura indigesta do proletário que ganhou voz, que ganhou uma voz imensa – que o Partido dos Trabalhadores chegaria ao poder. Era necessário convocar o poder pessoalmente, a energia social histórica que é poder, e dar voz a ele. E essa foi uma das tarefas assumidas por Lula. O célebre entusiasmo grego talvez fosse uma fala comprometida com um horizonte de transformação e de realização. Talvez não. No caso de Lula certamente era. E desse modo, para os espíritos conservadores, a imensidão da voz de Lula podia levar ao terrível sonho da ilimitação do desejo político.
A ascensão social e política de Lula foi embalada por sua voz de popular marcado pela experiência social de ser pobre no Brasil, que fazia exigências urgentes ao país, como a voz que dava expressão à posição coletiva de seu partido. E na cultura do seu tempo tal processo político não foi representado nem pelo canto de um Chico Buarque, o grande cantor dos anos negros e do desejo geral de democratização, nem pelo anjo melodramático de Milton Nascimento, e muito menos pelo erotismo modernizante, popular liberal, de Caetano Veloso. Esses músicos estavam ligados a outra temporalidade de projeto histórico, a outro tique-taque da história. Quem representou esteticamente o mesmo impulso contido na prosódia bárbara civilizada de Lula, a mesma energia social fantástica, que emergia da pressão absurda do Brasil sobre a vida dos seus pobres, a mesma demanda imediata de transformação urgente, necessária e racional, que era a petista clássica na voz de comício de Lula, foram os garotos de periferia da grande cidade, os Racionais MC’S e seu imenso cantor e poeta moderno Mano Brown.
O crítico Walter Garcia analisou em detalhes a natureza da pressão e da urgência na voz forte de Brown. E podemos mesmo dizer que o rapper tanto mimetizava quanto apoiava Lula fortemente com sua música, nessa profunda afinidade estrutural de estilos e matérias, para a sua massa de jovens garotos da periferia, do movimento hip–hop, garotos que não ouviam de nenhum modo Chico Buarque ou Caetano Veloso, mas ouviam, felizmente, a crítica racional radical de Brown. Curiosamente, para a classe média alta de esquerda, algo impotente e algo importante, no movimento de ascensão de massas do lulismo ao poder, foram as imagens fortes e a voz cada vez mais fraca de Cazuza, o anjo playboy de esquerda, que cantaram o desejo crítico histórico próprio de Lula.
Creio que não deixa de ser muito significativo que durante os anos de Lula no poder a música popular brasileira tenha se dissipado e se dissolvido no pop barato de pequenos grupos, entre o samba, o groove e a música eletrônica, música brasileira para inglesinho ver, em um som de estar e de festinhas felizes, e de cantoras malemolentes de vozes bonitinhas, com seus sambinhas e canções simplistas, que pareciam simular experiência no seu mundo de mercado, na plena felicidade de curtir os privilégios de seu próprio lugar no mundo. Como se sabe, tal movimento amplo de dissolução e de rebaixamento do valor social da música popular levou até Chico Buarque, no período, a se questionar sobre o fim do ciclo histórico da relevância da forma canção.
De fato, aconteceu também uma verdadeira desmobilização das exigências do discurso e da voz do político, que só era séria agora, a partir da chegada ao governo em 2003, para garantir que tudo ia às mil maravilhas em seu país da ascensão de massas ao primeiro círculo do consumo, ou para demandar tolerância e impunidade dos privilegiados para os descaminhos de seu grupo e de seus aliados no poder, quando não até para simular a própria velha voz, fazer o teatro, um teatrinho de rua, de um confronto de classes retórico para garantir ao seu povo brasileiro a identificação com o líder combativo que dava mesmo a garantia, pessoal, de que aquele povo finalmente podia se sentir incluído, no país da pior concentração de renda do mundo, que finalmente pagava, por meio da voz autopropagandística de Lula, a sua secular dívida social. Todos esses movimentos de transformação política e da voz de Lula corresponderam sintomaticamente à ausência de vozes fortes, no sentido do artista particular, uma personalidade estética da voz, ou de música forte, em uma cultura que se resolvia, por fim, apenas como cultura de consumo.
Mas esse processo de sucateamento da canção no pop genérico malemolente, com o sucateamento do desejo histórico de transformação efetiva, e não de mercado, do país, mesmo que verdadeiro, e tendo acontecido de fato, é também ilusório. Para mim, a verdadeira voz que emergiu subterraneamente no período Lula, e que guardou, de um novo modo, a energia social da canção brasileira em si, foi a do novo gigante da MPB Romulo Fróes, a voz que, para mim, marcou verdadeiramente, em uma real contradição de valor dialético, o tempo do fim do governo e da contribuição de Lula para o país.
Na música desse artista, a energia social forte que embala a canção não é mais a da urgência da crítica, a de um passo novo na vida dos pobres do Brasil, do rap racional do período da ascensão lulista: aquela demanda de imensa pressão foi resolvida no processo de integração ideológica entre os senhores e os populares, de alta voltagem pró-capitalista, própria do governo petista, bem amarrada na garantia do corpo retórico de Lula. A nova voz da música brasileira fala daquilo que o governo, e o processo histórico alienado da esquerda que enfim se adaptou ao Brasil, não alcançou, daquilo que ele não pode saber, não tem como pensar e não pode realizar…
Dando voz ao trabalho poético incomum, altamente investigativo e sem traço de conformismo de homens como Eduardo Climachauska e Nuno Ramos, tal voz contém os elementos de fato negados de uma civilização finalmente realizada na voz esmaecida de seu grande líder social, o Lulinha paz e amor. O amplo processo histórico lulista estaria assim representado, em um movimento dialético que expressa sua verdade incompleta, entre a rosa do povo dos Racionais Mc’s e o verdadeiro claro enigma de Romulo Fróes. Essa música nova, e sua estranha voz, porta negatividade conceitual diante de um mundo falsamente realizado, conhecimento estético elevado e abertura ao desconhecido, o oposto de toda vulgaridade ofertada do presente, vida emocional antimaníaca, anticelebração da ordem totalitária da felicidade de mercado, tristeza que sustenta um mundo multiplicado, que perdeu toda referência para a própria representação. Um labirinto em cada pé. E não há dúvida de que essa música e essa voz voltam a ter energia.
Tal energia poderosa do pensamento estético que esses artistas imprimiram à sua música, com a indefinível, grave e suave voz de nobre popular de Romulo Fróes, é, penso, a matéria social esquecida, desconhecida, necessariamente deixada para trás, e, nesse sentido, estruturalmente melancólica, no processo de integração social inexorável da voz de Lula, que virou por fim cimento ideológico condescendente consigo mesmo, e com tudo o que existe, a voz de um povo orientado em massa para a vida do mercado, que não vende a verdade.
Ainda menos de algo cantado, exatamente agora, em outra voz, uma voz entre cão e lobo, tão forte quanto pouco ouvida.
TALES AB’SABER (1965) é psicanalista, professor de filosofia da psicanálise da Universidade Federal de São Paulo. É autor do ensaio de política e cultura Lulismo, carisma pop e cultura anticrítica (Hedra).
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