serrote #6, novembro 2010
P de Paradoxo, FRITZ MAUTHNER
ALFABETO serrote
“Paradoxo” já era uma palavra corrente entre os gregos e designava o que era para doxan, contra a opinião geral entre eles, isto é, contra a expectativa, o que era inacreditável, espantoso. Os latinos adotaram a palavra na forma grega e fizeram dela quase um termo técnico do esporte (nas competições, “paradoxo” podia designar aquele que vencia contra todas as expectativas, mais ou menos como o inglês outsider, que, ao contrário do favourite, pode significar o azarão); finalmente, fizeram dela um termo do ofício de escritor, pois gostavam de dar o título Paradoxa a coletâneas de frases retóricas surpreendentes, o que Cícero assim traduz com toda a minúcia: quae sunt mirabilia contraque opinionem omnium.
Dos romanos, a expressão passou aos modernos povos civilizados, mas de tal modo que, tanto as afirmações surpreendentes como os indivíduos que, por vaidade, gostam de fazer tais afirmações foram chamados de paradoxais. Hoje em dia, chamam-se de paradoxais as novas verdades que ainda contradigam a opinião geral e estejam muito longe de se tornar lugar- -comum; mas se chamam de paradoxais, ou também de espirituosas, inverdades formuladas de modo engenhoso, com as quais pessoas fúteis buscam desempenhar um papel na sociedade ou no mercado editorial. Uma frase paradoxal, portanto, não precisa ser verdadeira, o que só precisou ser dito expressamente em nossa época de paradoxos maçantes; Schopenhauer era um pouco orgulhoso demais dos paradoxos de seu sistema.
As novas verdades importantes, sem dúvida, sempre entraram em contradição com a opinião pública da época; posteriormente, no entanto, tiveram de ser admitidas como verdades por aquela mesma opinião pública, embora continuassem em contradição com aquilo que se manifesta, em contradição com aquilo que os sentidos humanos atestam. Nesse sentido, foi paradoxal quando Copérnico afirmou que o Sol permanece em repouso e a Terra gira. Sem dúvida, é o engano dos sentidos que produz a opinião geral, o realismo ingênuo; e aquilo que entra em contradição com este contradiz de maneira especialmente paradoxal a linguagem comum. Não espanta, assim, que verdades paradoxais da crítica do conhecimento pareçam paralogias ou paralogismos, ou seja, sintomas de algum distúrbio mental.
Tradução de MÁRCIO SUZUKI